Meu INSS cria sistema para contestação de descontos ilegais e é criticado por risco jurídico

A partir de 13 de maio de 2025, aposentados e pensionistas do INSS passaram a contar com um novo recurso para contestar descontos não autorizados em seus benefícios. O mecanismo foi divulgado como parte de uma resposta institucional a uma série de denúncias envolvendo cobranças indevidas feitas por entidades sindicais e associativas. A iniciativa, que envolve o uso do aplicativo “Meu INSS” e da central telefônica 135, pretende oferecer mais autonomia aos beneficiários para fiscalizar as deduções aplicadas diretamente em seus proventos.

Pontos Principais:

  • INSS lança ferramenta para aposentados contestarem descontos não autorizados.
  • Entidades terão 15 dias úteis para justificar ou devolver os valores.
  • Especialistas alertam que a estratégia pode gerar aumento de ações judiciais.
  • Risco é que o INSS tenha de arcar com indenizações maiores, incluindo danos morais.

A decisão surge em meio a investigações que apontam o desvio de bilhões de reais entre 2019 e 2024, por meio de mensalidades aplicadas sem consentimento. A operação “Sem Desconto”, realizada pela Polícia Federal em conjunto com a CGU, já levou ao afastamento de servidores públicos e à saída de figuras importantes da Previdência, como o ex-presidente do INSS e o ex-ministro da pasta. O novo processo foi apresentado como um passo para restaurar a credibilidade institucional diante dos aposentados e pensionistas.

Contudo, especialistas da área previdenciária alertam que a forma como o INSS planeja operacionalizar o ressarcimento pode trazer consequências jurídicas e financeiras ao próprio órgão. A expectativa de que as entidades comprovem a regularidade ou devolvam os valores, antes da restituição às vítimas, pode gerar ações judiciais e atrasos no reembolso, além de ampliar o volume de processos judiciais contra a autarquia.

Contestação de descontos no aplicativo e telefone

Sistema do INSS permite que aposentados vejam e contestem descontos não autorizados direto no aplicativo ou pelo telefone, mas só o titular ou seu representante legal tem acesso - Foto: Joédson Alves/Agência Brasil
Sistema do INSS permite que aposentados vejam e contestem descontos não autorizados direto no aplicativo ou pelo telefone, mas só o titular ou seu representante legal tem acesso – Foto: Joédson Alves/Agência Brasil

Segundo a nova normativa, beneficiários poderão acessar a funcionalidade “Consultar desconto de entidades associativas” diretamente no aplicativo “Meu INSS”. Nessa área, será possível visualizar os valores descontados e contestá-los, caso o aposentado ou pensionista identifique alguma irregularidade. A central de atendimento 135 também estará habilitada para esse serviço.

Apenas o titular do benefício ou seu representante legal poderão acessar o sistema. A medida também prevê que as entidades sejam notificadas automaticamente após uma contestação, com prazo de 15 dias úteis para apresentar documentação comprobatória. Entre os documentos exigidos, estão:

  • Documento de identidade do beneficiário
  • Termo de filiação sindical ou associativa
  • Termo de autorização para desconto em benefício

Caso a entidade não apresente resposta dentro do prazo, o INSS emitirá uma Guia de Recolhimento da União (GRU) e exigirá a devolução dos valores. Em situações de omissão ou não comprovação, a cobrança será presumida como indevida.

Criação do Portal de Descontos e resposta das entidades

As associações e sindicatos que mantêm acordo com o INSS e realizaram descontos entre março de 2020 e março de 2025 precisarão se cadastrar no novo Portal de Desconto de Mensalidades Associativas (PDMA). Esse portal será o canal oficial para a recepção das notificações e envio das justificativas pelas entidades.

A comunicação entre as partes será registrada na plataforma, e os beneficiários serão informados sobre a decisão das entidades após cada contestação. A partir da resposta, o aposentado poderá:

  • Encerrar o processo, caso aceite a justificativa ou receba o valor de volta
  • Manter a contestação, apresentando argumentos e provas contrárias

Em casos de omissão, o INSS poderá encaminhar o caso à Procuradoria-Geral Federal, que terá a responsabilidade de cobrar judicialmente os responsáveis. O novo modelo, no entanto, tem sido alvo de críticas por parte de especialistas, que apontam riscos de judicialização em massa.

Críticas ao modelo e impactos judiciais

Para o advogado Diego Cherulli, presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário, o novo modelo amplia a responsabilidade do INSS de forma arriscada. Segundo ele, ao condicionar a devolução dos valores à apresentação de provas por parte das entidades, o órgão corre o risco de atrasar ressarcimentos e ser processado por danos morais e materiais.

Na análise do especialista, o modelo ideal seria o inverso: devolver os valores imediatamente aos beneficiários lesados e, em seguida, buscar ressarcimento junto às entidades envolvidas. A estratégia atual, segundo ele, tende a aumentar o volume de ações judiciais e o custo final para o Estado, uma vez que o INSS será o único com recursos para arcar com eventuais condenações.

Cherulli também menciona que a fila de contestação pode se transformar em um novo gargalo dentro do sistema previdenciário, já sobrecarregado por processos administrativos e judiciais. A experiência recente de fraudes e a demora institucional para reagir agravam o problema.

Desdobramentos da Operação Sem Desconto

A Operação Sem Desconto, deflagrada pela Polícia Federal e pela CGU no mês anterior, revelou um suposto esquema que desviou cerca de R$ 6 bilhões. Os valores teriam sido repassados mensalmente para entidades e sindicatos mediante descontos não autorizados em benefícios previdenciários.

Cinco servidores do INSS e um agente da Polícia Federal foram afastados por decisão judicial. A repercussão da operação levou à renúncia de Alessandro Stefanutto da presidência do INSS e à saída de Carlos Lupi do Ministério da Previdência. O episódio gerou pressão por medidas concretas para combater fraudes e proteger os aposentados.

Além disso, movimentos parlamentares se intensificaram, culminando no pedido formal de abertura de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para investigar a atuação das entidades e a responsabilidade dos órgãos públicos.

Impactos sociais e jurídicos para os beneficiários

Com o avanço das denúncias, um mercado paralelo de assessorias e plataformas digitais se formou, oferecendo cálculos e modelos de ações para aposentados que desejam buscar ressarcimento. Isso criou um novo campo de disputa judicial, onde o principal alvo tende a ser o próprio INSS.

O temor é que a judicialização em massa sobrecarregue ainda mais o Judiciário e amplifique os prejuízos financeiros da União. Os próprios aposentados, diante da complexidade do novo sistema, podem acabar recorrendo à Justiça com maior frequência.

Especialistas também apontam a necessidade de simplificação no acesso às informações e nos canais digitais do INSS. O aplicativo “Meu INSS”, citado como principal ferramenta de contestação, já vinha sendo alvo de críticas por apresentar falhas de usabilidade, principalmente entre os usuários idosos.

Propostas alternativas e próximos passos

O cenário descrito aponta para a necessidade de uma revisão mais profunda das políticas de controle de descontos nos benefícios previdenciários. A proposta sugerida por especialistas, de realizar a devolução imediata com posterior cobrança das entidades, poderia reduzir o impacto social da fraude e minimizar a exposição do INSS a processos judiciais.

Também foram sugeridas melhorias técnicas na plataforma digital, com foco na acessibilidade e transparência. O objetivo é garantir que os beneficiários compreendam os descontos aplicados, possam contestá-los com facilidade e tenham garantias de retorno sem necessidade de processo judicial.

A expectativa agora gira em torno da regulamentação da medida, do andamento das investigações e da resposta política ao pedido de abertura da CPMI. A crise deflagrada pelo escândalo das cobranças irregulares ainda deve gerar novos capítulos, com implicações jurídicas, administrativas e sociais para os próximos meses.

Fonte: Agenciabrasil, G1 e CNN.

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