Redes sociais: o lucro da ansiedade juvenil e o perigo para a liderança do futuro

Instagram e TikTok foram pensados para engajar, mas, acabaram acendendo uma epidemia silenciosa de angústia juvenil. Enquanto os lucros disparam, a saúde mental dos jovens afunda. E, com ela, talvez a qualidade da liderança do futuro.

Por muito tempo, o debate sobre redes sociais e juventude girou em torno das horas de tela. Depois da pandemia, com a explosão do ensino remoto e do isolamento social, o tempo que adolescentes passam em frente ao celular triplicou em diversos países. E as consequências emocionais revelaram que o problema vai muito além dos minutos no scroll infinito: a verdadeira ameaça está no conteúdo e em como ele é entregue.

Instagram e TikTok, as duas plataformas mais populares entre os adolescentes, foram desenhadas para capturar e manter a atenção. E fizeram isso com maestria. Mas, o preço desse sucesso começa a ficar visível: ansiedade, depressão, distúrbios alimentares, automutilação e perda de autoestima entre os jovens usuários.

O algoritmo sabe mais do que o usuário imagina

Ambas as plataformas usam algoritmos sofisticados, capazes de ler padrões de comportamento e sugerir conteúdos com precisão cirúrgica. O Instagram, sob comando da Meta, aprendeu a explorar o corpo em transformação dos adolescentes, principalmente meninas, para mantê-los conectados. O TikTok, por sua vez, desenvolveu o sistema de recomendação mais poderoso da internet: ele não espera você buscar nada. Ele entrega compulsivamente. “É como colocar uma criança para competir com os melhores engenheiros do mundo”, alertou o ex-secretário da Saúde dos EUA, Vivek Murthy. “Não é uma luta justa”.

Os resultados dessa lógica são visíveis: Tudo isso em vídeos de 15 segundos. A cada rolagem, uma micro dose de dopamina.

  • Conteúdos estéticos extremos, com padrões de beleza irreais;
  • Desafios virais perigosos;
  • Dietas radicais e tendências de “autoaperfeiçoamento tóxico”;
  • Sexualização precoce e distorção da noção de valor próprio.

Instagram: do feed de fotos à fábrica de comparações

O Instagram nasceu em 2010, junto com a câmera frontal do iPhone — o que deu origem à cultura do selfie. Em 2012, foi comprado por Mark Zuckerberg, que logo percebeu seu poder de sedução sobre os jovens. Em 2016, ao sentir a ameaça do TikTok, a plataforma mudou seu modelo e adotou o feed algorítmico, priorizando conteúdo que gerasse mais engajamento, não necessariamente mais verdade.

Esse foi o ponto de virada: a plataforma passou a alimentar a comparação social constante, criando um ambiente onde adolescentes — em especial meninas — se medem o tempo todo com padrões inalcançáveis. Pesquisas internas da própria Meta revelaram:

O Instagram faz 3 em cada 10 adolescentes se sentirem mal consigo mesmos. Mais de 10% das meninas relataram agravamento de distúrbios alimentares ou pensamentos suicidas. A principal causa? A dinâmica de comparação estética promovida pelo app.

Apesar das evidências, Mark Zuckerberg negou os impactos em audiência no Congresso dos EUA, afirmando que o Instagram “pode ter efeitos positivos”.
Uma meia-verdade que silencia um problema sistêmico.

TikTok: o novo epicentro da crise

Se o Instagram acendeu a faísca, o TikTok virou o incêndio. Hoje, é a plataforma com maior tempo médio de uso entre adolescentes. Com seu formato de vídeos curtos, previsivelmente imprevisíveis, ele estimula um comportamento semelhante ao de máquinas caça-níqueis: o cérebro busca o próximo “golpe de prazer” visual sem saber quando virá.

“O TikTok não só prende a atenção. Ele reconfigura o cérebro de adolescentes em formação”, afirma um neurocientista da Universidade de Stanford.

Entre as consequências mais visíveis:

  • Ansiedade social crescente;
  • Dificuldade de foco e concentração;
  • Explosão de transtornos de imagem corporal;
  • Casos de automutilação e ideias suicidas em alta;
  • Profissionais na liderança com distorção da realidade.

E o mais alarmante: quanto mais jovens são os usuários, mais intensos são os efeitos. Além disso, o TikTok é controlado pela ByteDance, sediada na China. Lá, a versão do app (Douyin) é altamente regulada: possui limites de tempo, restrições para menores e foco em conteúdo educacional. No Ocidente, o modelo é o oposto: liberdade irrestrita, coleta massiva de dados e engajamento a qualquer custo.

Os líderes do futuro estão sendo moldados por algoritmos

Os impactos, no entanto, não se limitam à adolescência. Especialistas em comportamento alertam que os efeitos cognitivos e emocionais do uso intenso dessas plataformas podem se estender para a vida adulta e, claro, para o ambiente corporativo.

A geração que hoje forma sua identidade sob o olhar dos algoritmos será, em pouco tempo, a responsável por liderar empresas, inovar, tomar decisões estratégicas e construir soluções para o mundo real.

“Estamos formando cérebros treinados para o agora. Para a recompensa rápida, a validação constante, o engajamento superficial. Mas, liderança exige o oposto: paciência, profundidade, resiliência”, afirma a psicóloga e educadora Ana Cláudia Torres, especialista em desenvolvimento juvenil.

A preocupação é que, se nada mudar, o mundo corporativo do futuro poderá ser comandado por profissionais que confundem visibilidade com competência, e que foram ensinados a reagir em vez de refletir.

Lucros estratosféricos, sofrimento invisível

Enquanto adolescentes relatam sentimentos de inadequação, isolamento e exaustão emocional, as plataformas seguem quebrando recordes de lucro. A Meta (dona do Instagram e Facebook) fechou 2023 com US$ 130 bilhões em faturamento, US$ 40 bilhões em lucros. O TikTok, por sua vez, prepara IPOs, amplia publicidade e conquista marcas globais — mesmo sob crescentes investigações internacionais sobre sua atuação e efeitos.

Nos bastidores, as empresas sabem exatamente o que fazem. E, mesmo diante de denúncias, testes internos, escândalos e depoimentos comoventes de pais que perderam filhos, pouca coisa muda de fato.

Os futuros líderes pedem socorro em silêncio

A chamada “geração ansiosa” não é fruto do acaso. Ela foi moldada — vídeo por vídeo, like por like — por sistemas desenhados para explorar a atenção, a vaidade e a vulnerabilidade emocional.

Agora, esses mesmos jovens estão crescendo com suas ideias de valor, sucesso e autoestima profundamente influenciados por algoritmos que recompensam aparência em vez de profundidade, reatividade no lugar de reflexão, performance e não consistência.

É essa geração — formada entre filtros, dancinhas, comparações e validações instantâneas — que assumirá, em breve, os cargos de liderança nas empresas, na política, na ciência, na educação e nas tecnologias do futuro.

Se não houver intervenção com regulação inteligente, educação digital crítica e promoção de saúde mental, corremos o risco de entregar o futuro a líderes imediatistas, emocionalmente frágeis e sedentos por aprovação pública, mas sem preparo para sustentar processos complexos e decisões coletivas duradouras.

As redes sociais não são inimigas. Mas os algoritmos que colocam o vício acima do bem-estar são um risco real e urgente. O que está em jogo não é apenas o bem-estar dos jovens de hoje, mas também a qualidade da liderança de amanhã.

Ignorar o problema é negligência. Normalizá-lo é cumplicidade. Cuidar dessa geração é proteger o futuro.

*Coluna escrita por Fabio Ongaro, economista e empresário no Brasil, CEO da Energy Group e vice-presidente de finanças da Camara Italiana do Comércio de São Paulo – Italcam

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