Guerra na Ucrânia completa 3 anos e pode acabar em acordo “injusto”

A ofensiva russa contra a Ucrânia, lançada pelo presidente Vladimir Putin como uma “operação militar especial”, completa seu 3º ano nesta 2ª feira (24.fev.2025). 

Justificada pelo governo russo como uma ação para “desmilitarizar” e “desnazificar” o país vizinho, além de proteger a população de províncias separatistas como Donetsk e Luhansk, a investida rapidamente se transformou no maior conflito em solo europeu desde a 2ª Guerra Mundial. 

Diversas tentativas de acordo para o fim da guerra foram realizadas sem sucesso. Os Estados Unidos e países europeus desempenharam um papel ativo na diplomacia durante esses 3 anos, mas com o início do 2º mandato de Donald Trump (Republicano) à frente da Casa Branca, a abordagem mudou. 

O líder norte-americano retirou a Ucrânia e os aliados europeus das negociações, priorizando um diálogo direto com a Rússia para buscar uma solução. Trump e Putin, inclusive, podem se encontrar pessoalmente ainda este mês, embora a data seja incerta. 

Especialistas entrevistados pelo Poder360 avaliam ser grande a possibilidade de que Trump feche uma negociação diretamente com a Rússia, que será considerada injusta pela Ucrânia. Também afirmam que o presidente dos EUA conseguirá impor a paz a Volodymyr Zelensky, apesar de o líder da Ucrânia ter dito que rejeita qualquer acordo que não tenha a participação ucraniana.

“A maior parte da ajuda [à Ucrânia] é dos norte-americanos. O poder de Donald Trump reside nisso. No fato de os EUA serem o cofre e terem as fábricas que fornecem armas e munição para a Ucrânia”, afirmou Pio Penna Filho, professor de relações internacionais da UNB (Universidade de Brasília). 

De maneira semelhante, Hussein Kalout, cientista político, pesquisador de Harvard e conselheiro consultivo internacional do Cebri (Centro Brasileiro de Relações Internacionais), avalia que sem o apoio econômico e militar dos Estados Unidos, “a Ucrânia não tem como sobreviver ao embate com a Rússia”. Por isso, seria obrigada a aceitar um eventual acordo negociado somente pelos norte-americanos e russos. 

A trativa, no entanto, pode ser temporária. Segundo Vitelio Brustolin, professor de Relações Internacionais da UFF (Universidade Federal Fluminense) e pesquisador de Harvard, a história mostrou que ceder a um agressor para evitar um conflito maior, ação conhecida como política de apaziguamento, resulta em uma paz frágil. 

Ele também diz que a Ucrânia não confia que a Rússia respeitará um acordo de paz e teme ser atacada novamente no futuro. Para o professor, isso significa que qualquer acordo precisaria ter fortes garantias de segurança. Brustolin avalia ainda que Ucrânia e Europa precisam participar das negociações para a criação de um tratado sustentável. 

“A paz não é duradoura quando os países interessados geopoliticamente na questão não são consultados ou não fazem parte das negociações, inclusive aqueles cuja segurança está em risco, como é o caso da Ucrânia e da Europa”, disse em entrevista ao Poder360

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Divulgação/President of Ukraine – 7.dez.2024

Os presidentes Volodymyr Zelensky (Ucrânia), Emmanuel Macron (França) e Donald Trump (EUA) participaram em dezembro de encontro para discutir a guerra na Ucrânia em Paris; a visita de Trump à França foi a 1ª viagem do republicano depois de sua vitória nas eleições de 5 de novembro

AS AÇÕES DE TRUMP 

Uma das primeiras declarações do republicano sobre sua capacidade de acabar com a guerra foi dada em 27 de junho do ano passado, durante o 1º debate presidencial com o ex-presidente Joe Biden (Democrata). Ele afirmou que poderia resolver o conflito antes mesmo de tomar posse

Dois meses depois, em 27 de setembro, Trump se encontrou com Zelensky e voltou a declarar que iria resolver a guerra muito rapidamente se fosse eleito. O republicano também disse, na ocasião, ter um “relacionamento muito bom” com Putin. 

O professor de relações internacionais da Faap (Fundação Armando Alvares Penteado), Lucas Leite, explica que Trump quer terminar o conflito “a qualquer custo, independentemente do que pensa a Ucrânia”. Essa atitude é “muito diferente” da adotada por Biden. Para o especialista, o democrata buscava uma solução que assegurasse a soberania ucraniana e não representasse uma derrota completa para a Rússia.  

Os Estados Unidos começaram suas negociações ignorando a UE (União Europeia) e a Ucrânia em 18 de fevereiro. Delegações norte-americanas e russas se reuniram em Riade, na Arábia Saudita, e concordaram em formar equipes e nomear negociadores para o fim do conflito. 

Zelensky manifestou descontentamento com o episódio, enquanto Trump fez diversas críticas ao líder ucraniano. Afirmou que Zelensky é um “ditador sem eleições” e faz um “trabalho terrível” no cargo. Segundo o republicano, o mandatário levou a Ucrânia a uma guerra que não poderia ser vencida e provocou a “morte desnecessária de milhões”

EUROPA 

Zelensky defende que os aliados europeus estejam envolvidos nas negociações de paz. Ele também pediu a criação de um “Exército da Europa” durante seu discurso na Conferência de Segurança de Munique, realizada na Alemanha de 14 a 16 de fevereiro de 2025. 

Na ocasião, declarou que o continente não poderia mais depender dos EUA para se proteger e que a formação de uma tropa unificada seria fundamental para que “o futuro da Europa dependa só da Europa e as decisões sobre europeus sejam feitas na Europa”

Para Vitelio Brustolin, os europeus têm uma base industrial de defesa forte e não são “impotentes”. O professor também explica que a UE está criando mecanismos financeiros para aumentar seus gastos militares sem que isso afete os limites fiscais dos países integrantes do bloco. Na Conferência de Munique, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, apresentou uma proposta que permitiria a prática. 

Pio Penna e Hussein Kalout, por outro lado, têm avaliações mais céticas em relação à força dos europeus. O professor da UNB afirma ser “difícil” que a Europa assuma o papel dos EUA na assistência à Ucrânia. E o cientista político e consultor do Cebri argumenta que, mesmo discordando do eventual acordo entre Trump e Putin, o continente não terá força suficiente para impedir ou rever sua implementação. 

“A pressão norte-americana será transcendental, especialmente no campo econômico, sobre esses países”, afirmou Kalout. 

Líderes europeus manifestaram descontentamento com a exclusão da Europa pelos Estados Unidos nas negociações de paz, já que as conversas envolvem a segurança do continente. 

O presidente da França, Emmanuel Macron, que liderou uma cúpula de emergência em 17 de fevereiro para debater a guerra, tentou amenizar as tensões ao afirmar que Trump quer construir a paz entre Rússia e Ucrânia. Mas declarou que as negociações o fizeram se sentir “inquieto”

Macron estará em Washington D.C. nesta 2ª feira (24.fev) para se encontrar com Trump. Um dos objetivos do líder francês é convencer o presidente dos Estados Unidos de que negociar só com a Rússia pode fazer com que o republicano seja visto como fraco perante nações como a China. 

Linha do tempo

Leia um resumo dos principais movimentos nestes 3 anos de guerra:

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