Baderna: conheça a bailarina que virou sinônimo de confusão

Retrato de Marietta Baderna, principal bailarina do Teatro alla Scala em Milão, 1846Coleção Cia Fornaroli, Biblioteca Pública de Nova York.

Pouca gente sabe – ou parou para pensar nisso – mas a palavra “baderna”, tão usada para descrever situações de bagunça ou confusão, nasceu do nome de uma mulher real. Marietta Baderna foi uma dançarina italiana de grande prestígio na Europa, que desembarcou no Brasil em 1849.

Com apenas 21 anos, se apresentou no atual Teatro João Caetano, no Rio de Janeiro, e rapidamente ganhou notoriedade — mas também muitos desafetos.

“Ela dançava com pessoas escravizadas e adotava ritmos afro-brasileiros em suas apresentações. Isso, numa sociedade escravocrata e conservadora, era considerado uma postura subversiva”, explica ao iG, Ester Pirolo, professora do Centro de Comunicação e Letras (CCL) da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

O nome da bailarina acabou se associando ao tumulto causado por seus fãs — os chamados “badernistas”.

Revoltados com a rejeição que Marietta sofria dentro do teatro, eles boicotavam espetáculos e faziam escândalos durante outras apresentações.

“Batendo os pés no chão e provocando uma grande ‘baderna’, termo que passou a classificar, de forma pejorativa, qualquer situação de bagunça, desordem, confusão”, conta a professora.

De Maquiavel a Dante

Esse tipo de transformação de um nome próprio em palavra de uso comum não é raro na língua portuguesa. Casos famosos incluem “maquiavélico” (de Maquiavel), “pasteurizar” (de Pasteur), “dantesco” (de Dante) e até “sanduíche”, que veio de John Montagu, conde de Sandwich.

“As apropriações de nomes próprios têm motivação histórica e cultural. A escolha do nome é espontânea, mas o formato segue padrões morfológicos da língua”, explica Ester.

No caso de “baderna”, há ainda um viés de gênero que precisa ser observado.

“Sempre que temos uma figura feminina em posição de destaque, temos, também, muitos preconceitos implicados na situação”, aponta a professora. “E o triste dessa situação é que, hoje, ainda temos que estar sempre alertas, pois as mais diferentes formas de preconceito ainda persistem e transparecem nas nossas palavras.”

Com a velocidade das redes sociais e o impacto dos memes, novos casos como o de Marietta podem surgir.

“As línguas são sociais e se transformam o tempo todo. E se pensarmos na rapidez com que circulam as informações nas redes sociais e na reconhecida criatividade dos brasileiros para produzirem memes, é quase certo que continuarão a surgir ‘novos badernas’ no uso atual da língua portuguesa”, conclui Ester Pirolo.

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