Ex-funcionária do “Careca do INSS” revela como funcionava “SAC das fraudes”

Um dos maiores escândalos já registrados na Previdência Social ganhou mais informações. Detalhes sobre a atuação do call center ligado ao esquema bilionário de descontos ilegais em aposentadorias vieram à tona nesta semana.

A denúncia partiu de uma ex-funcionária das centrais de atendimento usadas pela quadrilha do chamado “Careca do INSS”, alvo da Polícia Federal (PF) na Operação Sem Desconto.

Segundo o relato da ex-telefonista, que trabalhou até abril deste ano para as empresas Callvox e Truetrust Call Center, o telemarketing operava como um verdadeiro SAC das fraudes.

Milhares de aposentados eram enganados com cobranças indevidas no benefício e, ao tentarem reclamar, eram novamente manipulados para desistirem das queixas. Confira mais detalhes revelados pela ex-funcionária a seguir.

Como funcionava o “SAC das fraudes” do INSS?

Conforme a denúncia, feita pela ex-funcionária em entrevista sob condição de anonimato, ao Metrópoles, os atendentes seguiam um roteiro pronto para conter as reclamações dos aposentados que descobriam os descontos mensais sem nunca terem autorizado qualquer serviço. A orientação era clara: ganhar tempo.

Ela revelou que, inicialmente, eles eram indicados a informar que o valor do estorno seria liberado em 10 dias, mas o prazo ia aumentando. Depois passou para 20 e 30 dias, e os ressarcimentos ficavam menos frequentes.

O roteiro incluía ainda justificativas enganosas. Os atendentes diziam que os descontos poderiam ter sido autorizados via WhatsApp, em ligações de telemarketing ou até por familiares dos idosos.

Tudo para descaracterizar a fraude e impedir que as vítimas procurassem a Justiça.

“A gente tinha que falar para eles que [o processo de filiação] era feito por links de WhatsApp, ligações de telemarketing ou eles mesmos devem ter aceitado na hora que foram contratar a aposentadoria. Mas eles não sabiam, e a gente também que trabalhava lá, nem sabia que isso era uma fraude”, diz ela.

Saiba mais: 7 golpes contra aposentados do INSS e como evitar

Os relatos indicam que, nos primeiros meses, algumas vítimas realmente conseguiram reaver os valores cobrados indevidamente.

No entanto, desde novembro de 2024, os reembolsos teriam se tornado cada vez mais raros.

A ex-funcionária citou ainda Adelino Rodrigues Junior, conhecido como Junior, como o gestor operacional do call center.

Ele tinha procuração para atuar em nome da CBPA e teria sido responsável por fazer pagamentos à esposa do ex-procurador do INSS, segundo as investigações.

Junior, de acordo com os relatos, também orientava os funcionários a seguirem o roteiro de atendimento fraudulento, além de administrar os grupos de atendentes nas empresas de telemarketing.

Quem está por trás do call center investigado?

A Truetrust Call Center, formalmente registrada como ACDS Call Center, foi criada em junho de 2023.

De acordo com a Polícia Federal, o nome seria uma referência aos sócios Antonio Carlos Camilo Antunes (Careca do INSS) e Domingos Sávio de Castro.

Eles são apontados como os principais articuladores do golpe, que movimentou até R$ 6,3 bilhões.

Leia também: Ressarcimento de desconto indevido: como funciona indenização

Além disso, a PF afirma que ambos pagaram propinas a dirigentes do INSS, como o ex-procurador Virgílio Oliveira Filho e o filho do ex-diretor de Benefícios André Fidelis, por meio do escritório de advocacia da família.

Quer continuar aprendendo com nossos conteúdos? Entre no canal da meutudo no WhatsApp e fique sempre atualizado sobre as novidades!

A operação da Polícia Federal

A Operação Sem Desconto, realizada em abril, foi o desdobramento direto das reportagens publicadas em 2023 pelo portal Metrópoles, que expôs o golpe.

A investigação revelou que, entre 2023 e 2024, centenas de funcionários foram contratados para trabalhar nas centrais de telemarketing envolvidas no esquema.

Os atendentes, segundo a denúncia, eram organizados em grupos de 20 pessoas e atendiam aposentados vinculados a diferentes entidades suspeitas, como:

  • CBPA (Confederação Brasileira dos Trabalhadores da Pesca e Aquicultura)
  • Abrasprev (Associação Brasileira dos Contribuintes do Regime Geral de Previdência Social)
  • Abapen (Associação Brasileira dos Aposentados e Pensionistas da Nação)

Dados da investigação apontam que a CBPA, por exemplo, não fazia nenhum desconto até 2022.

No entanto, em 2023, se tornou uma das líderes em arrecadação, chegando a faturar R$ 57,8 milhões em mensalidades suspeitas.

Curiosamente, tanto a Abrasprev quanto a Abapen foram excluídas da ação da Advocacia-Geral da União (AGU), que pede o bloqueio de R$ 2,56 bilhões de 12 entidades acusadas de corrupção. Já a CBPA segue como alvo prioritário da Justiça.

Queda de autoridades e desdobramentos

O escândalo já custou o cargo do ex-presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, e do ex-ministro da Previdência, Carlos Lupi.

A investigação segue em andamento, com expectativa de novas prisões e bloqueios de bens, e especialmente, do ressarcimento total dos valores descontados indevidamente dos beneficiários do INSS.

Se este conteúdo foi útil, não deixe de se cadastrar gratuitamente aqui para receber mais artigos informativos semanalmente em seu e-mail.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.