PCC e CV rompem aliança estabelecida em fevereiro; rivalidade se mantém na Paraíba

As facções Primeiro Comando da Capital (PCC) e Comando Vermelho (CV) romperam a aliança anunciada em fevereiro, que tinham o objetivo de cessar as mortes entre os grupos, reduzir os custos com a guerra e garantir a continuidade dos negócios ilegais. A informação foi divulgada pelo Ministério Público de São Paulo ao GLOBO, que também teve acesso a diversos comunicados do crime, os chamados salves.

Os relatórios das facções são datados de segunda-feira (28). Ao contrário de quando anunciaram a trégua – com um texto assinado de forma conjunta -, os novos salves são indivíduos.

O PCC afirma que, a partir destes dados, chega ao fim da aliança, e informa que o objetivo do armistício “foi sempre poupar vidas, especialmente de coleções de pessoas inocentes que estavam perdendo suas vidas por pura banalidade”. Esclarece que não aceita “covardia contra familiares ou pessoas inocentes de qualquer organização”. E que “questões que ferem a ética do crime nunca foram e nem serão aceitas em nenhuma aliança ou amizade”.

Já o CV comunica sobre a ruptura e diz que “o respeito à vida humana deve estar acima de tudo”. Proíbe também que seus integrantes, entre outras coisas, tirem a vida de pessoas “de bem por motivos banais”, citando as recentes mortes de jovens que fizeram sinais indicados às facções com as mãos – de um ano para cá, foram muitos os casos de mortos ou torturados em diferentes estados do país por postarem fotos com gestos de três dedos, uma alusão ao PCC (1533), e dois dedos (o V de vitória ou paz e amor), símbolo do CV.

A ruptura foi confirmada ao GLOBO pelo promotor de Justiça Lincoln Gakiya, do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público de Presidente Prudente, no interior do estado. Decretado pelo PCC, Gakiya atua há quase duas décadas contra a facção.

— Acho que isso era até esperado. Não imaginava que [a trégua] fosse perdurar. A que tenho conhecimento, já há algum tempo, é de que o Marcinho VP [líder principal do CV] não teria dado aval para essa trégua. E o aval dele seria indispensável. Isso pode ter levado a esse rompimento — com destaque para Gakiya.

Como mostrado ao GLOBO , Márcio dos Santos Nepomuceno, o Marcinho VP, havia negado “de forma veemente” a existência de uma trégua com o PCC, de acordo com relatório de inteligência da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen). O documento é do dia 22 de fevereiro.

Ao ser informado por sua defesa sobre as notícias veiculadas nas últimas semanas a respeito do suposto armistício, Marcinho VP classificou as informações como “fake news”, diz o relatório. Marcinho VP teria argumentado ainda que mantém “uma postura de respeito” frente ao PCC pelo fato de terem lideranças no mesmo sistema prisional. “Mas reiterou que as facções permaneceram como inimigas”, segundo o documento.

Gakiya atribuiu o rompimento também à dificuldade de implementação da mudança em facções com perfis organizacionais tão diferentes. Enquanto o PCC tem uma direção única, com estados devendo satisfazer à cúpula, o CV atua em esquema de franquias nos estados, com lideranças locais com mais autonomia.

— Em suma, interesses territoriais de disputa por tráfico é o que leva a esse rompimento. Porque ninguém quer abrir a mão do seu espaço — afirma o promotor.

Sinais da trégua

No fim de fevereiro, nove estados brasileiros afirmaram ter identificado “sinais concretos” da suposta trégua entre as facções criminosas, segundo relatório de inteligência da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo.

Os dados foram coletados pelo governo paulista junto às inteligências das Polícias Militares de 26 estados e do Distrito Federal. Questionados sobre a existência da suposta aliança entre as facções até então rivais, nove deles confirmaram a informação: Minas Gerais, Amazonas, Acre, Roraima, Ceará, Piauí, Rio Grande do Norte, Alagoas e Sergipe.

Além desses, outros novos estados afirmaram não ter dados suficientes para endossar a existência do armistício, diz o documento. Em três deles, ainda há pedidos de que a organização criminosa paulista permaneça em guerra com o fluminense. Cinco estados não retornaram.

Os estados com provas da aliança ocorreram principalmente nas regiões Norte (3) e Nordeste (5). Minas Gerais era a única de outra região do país que reportou a trégua.

Em apenas três estados do Nordeste não havia sinais concretos de conciliação. São Paulo, Rio Grande do Sul e Paraíba sustentaram a manutenção da rivalidade entre os grupos.

Por O Globo