OAB-PI pede suspensão de projeto de lei que propõe repatriação de imigrantes em Teresina custeada pelo município


A proposta foi apresentada na terça-feira (18) e a entidade se manifestou em seguida apontando riscos de violações aos direitos humanos e que o projeto vai contra dispositivos da Constituição Federal. Refugiados imigrantes venezuelanos
Arquivo
A Ordem dos Advogados do Brasil no Piauí (OAB-PI) pediu a suspensão de um projeto de lei que propõe repatriação de imigrantes em Teresina custeada pelo município. A proposta, do vereador Pedro Alcântara (Progressistas), foi apresentada nesta terça-feira (19), na Câmara Municipal.
As Comissões de Direitos Humanos e de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente da OAB-PI emitiram uma nota na qual apontam que o projeto apresenta riscos de violações aos direitos humanos e vai contra dispositivos da Constituição Federal.
A OAB-PI afirmou que o poder Legislativo e Executivo municipais devem priorizar estratégias de acolhimento e integração, em vez de medidas que possam resultar em xenofobia institucional ou exclusão social (leia a íntegra do comunicado ao fim da reportagem).
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Procurado pelo g1, Pedro Alcântara não se manifestou sobre o pedido da OAB até a publicação desta reportagem. Na terça, o parlamentar afirmou, em entrevista, que a proposta visa oferecer uma forma para estrangeiros que moram na capital possam voltar voluntariamente aos seus países.
“A prefeitura vai dar passagem de volta para todo e qualquer estrangeiro que mora aqui e que não pode bancar o seu retorno, voltar para o seu país”, explicou o vereador.
O parlamentar afirmou que o projeto não foi criado para os Povos Indígenas Warao, da Venezuela, que vivem na capital. “Ele [o projeto] cria a política de imigração em Teresina. Coincidentemente vai alcançar os venezuelanos”, afirmou.
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Contudo, Pedro Alcântara fez uma série de declarações relacionadas aos Warao residentes na cidade. “Fiz o levantamento e nós temos 49 famílias de venezuelanos, 44 recebem Bolsa Família, quatro recebem o BPC [Benefício de Prestação Continuada]. Eles têm café, almoço e janta, e tem moradia”, citou.
“E eles querem agora um assentamento. Cada um quer uma casa com três quartos. Ora, é melhor mandar eles de volta, do que construir aqui. Eles ficam a semana toda, nos semáforos, pedindo dinheiro. Porque eles têm o café, almoço e janta, mas não têm para tomar cachaça. Ficam bebendo. No domingo, é uma farra danada”, declarou.
O vereador afirmou que o projeto foi idealizado com o aval do prefeito Silvio Mendes (União Brasil). “Eu conversei com o prefeito e ele disse ‘faça o projeto que eu sanciono’. A prefeitura prefere mandar de volta, do que ter que gastar permanentemente”, disse.
Procurada, a assessoria de comunicação do prefeito informou que ele está em viagem, cumprindo agenda em Brasília, e que tenta contato para que ele se manifeste sobre a declaração de Pedro Alcântara.
Em sua nota, a OAB ressaltou que os Warao são parte da comunidade migrante na capital e que parte das crianças dessas famílias já nasceu no Brasil, “sendo, portanto, indígenas brasileiras”.
“É essencial garantir que suas especificidades culturais, sociais e identitárias sejam respeitadas. Nesse sentido, também propomos em ofício a realização de audiências públicas para assegurar que a comunidade migrante e indígena possa se manifestar e participar ativamente da construção de políticas que impactam suas vidas”, diz o comunicado.
Leia a íntegra da nota da OAB:
As Comissões de Direitos Humanos da OAB-PI e de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente vem a público expressar sua preocupação com o indicativo de projeto de lei que propõe a criação de uma política de imigração no município de Teresina voltada ao retorno de pessoas migrantes ao seu país de origem, com financiamento do poder público municipal e estadual.
As Comissões informam que oficiaram o Presidente da Câmara Municipal de Teresina, Enzo Samuel e o Vereador Pedro Alcântara, proponente do indicativo de projeto de lei que trata da política municipal de imigração, sugerindo sua suspensão e colocando-se à disposição para contribuir tecnicamente na construção de uma política migratória local alinhada aos direitos humanos e à legislação vigente.
A proposta inicial, que sugere o retorno de migrantes ao país de origem com financiamento do poder público municipal e estadual, apresenta graves riscos de violações aos direitos humanos, além de contrariar dispositivos da Constituição Federal, da Lei de Migração (Lei nº 13.445/2017) e de tratados internacionais ratificados pelo Brasil.
As Comissões estão em diálogo com órgãos fiscalizadores, Conselhos e Comitês, unificando esforços para fortalecer a rede de proteção às pessoas migrantes, refugiadas e apátridas residentes em Teresina-PI.
Reafirmamos a necessidade de que as políticas públicas já existentes no município e no estado sejam aprimoradas e ampliadas, garantindo o acesso a direitos fundamentais como moradia, saúde, educação, trabalho digno e assistência social.
Além disso, destacamos que qualquer ação direcionada à população migrante deve ser debatida de forma democrática e participativa, com ampla consulta às comunidades impactadas.
Dado que parte da comunidade migrante em Teresina-PI é composta pelos Povos Indígenas Warao, da Venezuela, é imprescindível que qualquer política pública que os afete respeite o direito à Consulta Livre, Prévia e Informada, conforme determina a Convenção nº 169 da OIT.
Muitas dessas famílias são não apenas migrantes, mas indígenas, e parte de suas crianças já nasceu no Brasil, sendo, portanto, indígenas brasileiras. Assim, é essencial garantir que suas especificidades culturais, sociais e identitárias sejam respeitadas.
Nesse sentido, também propomos em ofício a realização de audiências públicas para assegurar que a comunidade migrante e indígena possa se manifestar e participar ativamente da construção de políticas que impactam suas vidas.
A OAB-PI propõe a realização de reuniões técnicas com os poderes Legislativo e Executivo municipais, bem como com representantes da sociedade civil, para a construção conjunta de uma política migratória municipal baseada nos direitos humanos, na inclusão social e no respeito à legislação brasileira e internacional.
Qualquer alternativa deve priorizar estratégias de acolhimento e integração, em vez de medidas que possam resultar em xenofobia institucional ou exclusão social.
As Comissões reafirmam o compromisso com a proteção da dignidade das pessoas migrantes e seguirá acompanhando o debate sobre políticas migratórias em Teresina para garantir que os direitos fundamentais dessa população sejam respeitados.
A OAB-PI seguirá atuando de forma técnica e ética para que Teresina avance na construção de uma política migratória justa, solidária e alinhada aos princípios constitucionais e internacionais de direitos humanos.
Comissão de Direitos Humanos da OAB-PI
Comissão de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
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