Após disputas com grileiros, área ocupada por integrantes do MST vai ser destinada à reforma agrária, na Paraíba

Uma área de aproximadamente 58 hectares, localizada no Sertão da Paraíba, deverá ser destinada à reforma agrária, após uma parceria entre a Superintendência do Patrimônio da União (SPU), o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) e o Instituto Federal da Paraíba (IFPB). A área, pertencente até então ao IFPB, fica na zona rural do município de Princesa Isabel e estava há ao menos 10 anos sendo alvo de disputas entre trabalhadores sem-terra e grileiros.

O assentamento deverá beneficiar 22 famílias, do acampamento ‘Quilombo Liberdade’ e a entrega do patrimônio ao Incra, para o assentamento, ocorreu na última sexta-feira (7).

Como apurou o ClickPB, em uma das situações que envolvem a disputa pela terra está o assassinato de um homem e uma mulher em 2023. Como trouxe o ClickPB à época, os dois eram trabalhadores do Movimento Sem Terra (MST) e foram surpreendidos por dois homens que chegaram em uma moto, solicitando a assinatura de uma das vítimas em um documento.

Valdeci e Ana Paula foram assassinados a tiros em Princesa Isabel — Foto:Reprodução/Redes Sociais
Aldecy, coordenador do MST, e Ana Paula foram assassinados a tiros no acampamento em Princesa Isabel. (foto: reprodução/redes sociais/arquivo ClickPB)

Em meio a situação, eles acabaram efetuando disparos contra o homem, identificado como Aldecy Viturino Barros, de 44 anos e contra Ana Paula Costa Silva, de 29 anos, que estava auxiliando Aldecy a consertar goteiras em uma casa. Ele era coordenador do acampamento do MST. Aldecy deixou três filhos e Ana Paula, três.

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O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra da Paraíba (MST) denunciou a situação e pediu, à época, celeridade nas investigações, que seguem em andamento, conforme apurou o ClickPB.

Grilagem de terra e invasores de alta renda

Desde aquele ano, uma série de ações conjuntas foram realizadas, em parcerias entre o Governo Federal e o Governo Estadual, com objetivo, de cessar os conflitos na região, já que além deste episódio, eram comuns relatos de cerceamento da comunidade sem-terra por parte de pessoas ligadas a nomes de influência na região.

Entre as ações conjuntas, estiveram fiscalizações por parte da Polícia Militar, Polícia Federal e o acompanhamento por parte da SPU, IFPB e Secretaria Estadual do Desenvolvimento Humano (SEDH).

Área das disputas. (foto: divulgação/SPU)

A área, como apurou com exclusividade a reportagem, chegou a ser utilizada por pessoas de alta renda, para posteriormente fazer ‘grilagem’ no local, ou seja, se apossar do local público. Além da violência para assustar os trabalhadores rurais sem-teto no local, os mesmos utilizariam a área para realização de festas em que uma das características seria o excesso de álcool e som alto, causando medo a comunidade.

Por que o terreno era do IFPB?

O terreno, que fica localizado no sítio Lajes foi doado pelo Governo Federal para a instalação provisória da sede do Instituto Federal da Paraíba (IFPB), no ano de 2011. Depois da desativação do espaço como sede do IFPB, o mesmo passou a ser ocupado pelos integrantes do MST, que denominaram o local de acampamento ‘Quilombo Livramento’.

Algum tempo depois passou a ser alvo das disputas por parte de pessoas influentes da região que desejavam grilar a terra, como citado pela reportagem. A reversão para o patrimônio da união (SPU) ocorreu em novembro de 2023.

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Projeto-piloto deverá ser desenvolvido no acampamento

O ClickPB apurou que o Incra deverá realizar um arranjo produtivo sustentável no local, um projeto-piloto no âmbito do Instituto. Devem ser empregadas várias frentes de produção, já que possui um amplo módulo rural, devido à escassez de chuva.

SPU e Incra citam importância da ação de reforma agrária no local

O novo assentamento deverá levar o nome dos integrantes do MST mortos em meio aos conflitos na área. A informação foi divulgada em vídeo feito pelos superintendentes da SPU e do INCRA, Giovanni Marinho e Antônio Barbosa, respectivamente. Em conteúdo divulgado para a imprensa, eles comemoraram a garantia do uso da área por parte de trabalhadores rurais.

“(O dia 7) foi uma data muito especial, a SPU Paraíba, entregando ao INCRA Paraíba, uma área de 58 hectares no município de Princesa Isabel, na Paraíba. Essa área foi noticiada nacionalmente, porque teve duas mortes no campo por conflito agrário e agora a gente tá virando essa página. Estamos destinando essa área para um assentamento de trabalhadores rurais sem terra, que vai ser uma nova vida para aquela comunidade”, disse Giovanni Marinho, como observou o ClickPB.

São 58 hectares que vão ser destinados para as famílias rurais, trabalhadores daquela região. Essa é uma reação do poder público, há duas mortes violentas no campo, do Aldecir e da Ana Paula. E a gente tá hoje com a cabeça erguida dizendo o seguinte: vamos lutar e vamos entregar o patrimônio da União ao povo brasileiro”, falou.

Segundo o superintendente da SPU, o próximo passo é trabalhar a titulação das famílias.

Antônio Barbosa (a esquerda) e Giovanni Marinho (a direita), represantes do Incra e da SPU na Paraíba, respectivamente. (foto: divulgação)
Antônio Barbosa (a esquerda) e Giovanni Marinho (a direita), represantes do Incra e da SPU na Paraíba, respectivamente. (foto: divulgação)

Antônio Barbosa, do Incra, também falou do sentimento de justiça e da luta de Paula e Aldecir. “Fico muito feliz em estar recebendo esse documento definitivo da SPU, porque é o momento faz muita justiça aquelas famílias que esperam essa área, mas também resgata a memória de Paula e Aldecir que perderam a vida lutando em favor daquele povo por aquele pedaço de terra”, frisou.

” Eu estou emocionado em receber das mãos da SPU, que fez um trabalho profícuo e agora entrega as mãos do Incra, o documento pleno, né, para que o Incra, faça os próximos passos, estabelecendo, criando o assentamento Paula e Aldecir, fazendo uma justa homenagem àqueles aquele casal, aqueles dois companheiros, né, que foram atingidos, perderam a vida, né, mas que agora permanece, a memória deles permanece viva, né, com assentamento recebendo os seus nomes”. finalizou.

Barbosa também agradeceu ao Ministério Público Federal (MPF), por meio do procurador José Godoy e ao MST.

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