Secretário diz que projeto sobre profissionais de saúde em João Pessoa é assédio que fere bom senso: “vão parar cirurgia para bater ponto?”

O secretário de Saúde de João Pessoa, Luís Ferreira, falou à rádio Arapuan FM sobre o projeto de lei do vereador Guga Moov Jampa que quer cobrar ponto eletrônico a cada duas horas de profissionais de saúde. Em entrevista ao programa Arapuan Verdade, nesta quinta-feira (13), Luís disse que o projeto é inspirado em “vereadores midiáticos” de outros estados, os quais levantam polêmicas, e que “é um tipo de assédio que perpassa qualquer bom senso.” Ele também falou do uso profissional do celular para auxiliar os profissionais no atendimento.

“Eu acho que o que balizou esse projeto foi a fama dos vereadores midiáticos de São Paulo e Rio de Janeiro que fazem esses tipos de inserções em serviços públicos e acabam levando uma grande repercussão popular e eu entendo isso. Não estou criticando ninguém, você me fez uma pergunta e eu respondi. É uma estratégia muito mais pessoal do que uma estratégia administrativa para o povo”, argumentou o secretário, como verificou o ClickPB.

Luís Ferreira diz ser importante não condenar a classe médica e que existem profissionais bons e ruins em todas as áreas. Ele também explicou que os médicos e outros profissionais da saúde já batem ponto na Rede Municipal de Saúde.

“A gente tem que parar de marginalizar a classe médica, assim como na política. Existem cretinos na classe médica? Existem, mas não são a maioria. Existem cretinos na classe política? Existem, mas não são a maioria. O médico, o enfermeiro e o técnico já batem ponto no nosso sistema”, pontuou.

Tempo ideal de consultas

O secretário de Saúde disse haver um tempo médio para uma consulta de qualidade e que há um limite de atendimentos por turno de cada médico para que haja atendimento adequado.

“A Organização Mundial de Saúde (OMS) diz que uma consulta, para ser bem feita, tem que levar pelo menos de 20 a 30 minutos. Então o médico tem que atender de 12 a 16 pacientes por turno. Não sou eu que estou dizendo. O que eu não posso é obrigá-lo a atender mais. Se eu quiser que atenda mais, eu preciso contratar mais gente”, afirmou.

“Nós tínhamos uma realidade onde 240 mil pessoas não tinham um médico da família porque eram 60 equipes sem médicos nas Unidades Básicas de Saúde (UBS). Hoje, nós temos médicos em todas as unidades, nós temos mais unidades do que tínhamos, mais equipes do que tínhamos”, acrescentou.

Ponto eletrônico durante cirurgia ou reanimação de paciente

Luís ainda destacou como seria, na prática, essa exigência do ponto eletrônico a cada duas horas, considerando cirurgias e procedimentos como a reanimação de um paciente em parada cardíaca.

“O projeto de lei fala de uma forma geral das áreas assistenciais. Você imagina um paciente em parada cardíaca e o médico está lá fazendo a reanimação. Ele vai parar de fazer para bater o ponto? Imagina as cirurgias que duram mais de duas horas. Ele vai parar a cirurgia para bater o ponto? O anestesista também? O enfermeiro e o técnico também? Imagina os atendimentos que duram mais de duas horas”, contestou o secretário.

“Na minha opinião, é um tipo de assédio que perpassa qualquer bom senso”, destacou Luís Ferreira.

Unidades de saúde sem médicos

Questionado sobre a falta de médicos em algumas unidades de saúde, como acontece em algumas ocasiões, o secretário disse que “essa realidade de não encontrar o médico é muito inferior ao que foi outrora. Pode ter médico com atestado ou que engravidou. Então vão existir exceções, mas são exceções. A exceção não pode ser determinante de uma regra que coloque todos em cheque. Nós temos relatórios muito claros do quantitativo de pacientes que são atendidos e todos eles dentro das prerrogativas que a OMS coloca.”

Métodos de fiscalização já existentes

Ele disse, ainda, que são feitos acompanhamentos das situações em que médicos chegam atrasados ou faltam ao expediente. Completou dizendo que a Prefeitura de João Pessoa “paga por hora trabalhada. Então se o médico chegar atrasado, óbvio que ele vai ser advertido, mas ele não vai receber pelo quantitativo que ele iria receber. A Secretaria de Saúde é quem mais quer fiscalizar a atividade laborativa. Mas é importante que se entenda a realidade para saber a melhor forma de fazer isso. Existem diversas formas de balizar esse acompanhamento que não precisam ser tão extremas dessa forma”, esclareceu.

Luís Ferreira ainda detalhou que os médicos já batem ponto eletrônico no início e final do expediente e na saída e retorno do horário de almoço. “E, além disso, não basta somente bater o ponto. Nós temos o controle do quantitativo de pacientes que são atendidos. Hoje, eu consigo ver na minha sala quantos pacientes foram atendidos no posto de saúde ‘x’ numa quinta-feira de manhã…”, explicou.

“Se eu tenho a prerrogativa do Ministério da Saúde de que o médico tem que atender 12 pacientes de forma eletiva e quatro urgências, e eu vejo na minha ficha que ele atendeu dez, eu preciso saber o motivo. Então eu tenho o controle do quantitativo por médico e por unidade. E isso serve para unidades de saúde (UBS’s) e unidades hospitalares”, acrescentou.

Uso do celular

O secretário de saúde lembrou que o celular também é importante pelo uso da tecnologia para aperfeiçoar a profissão. “Eu tenho tudo no meu celular. Eu vou tirar a tecnologia e a gente vai voltar para o tempo das cavernas? No meu tempo de formado, a gente tinha que andar com um livro chamado ‘black book’ com as doses dos remédios porque é impossível decorar tudo. Hoje está tudo aqui na palma da mão. Então o uso profissional do celular tem que ser incentivado”, argumentou.

Luís Ferreira concluiu dizendo ter “certeza que os parlamentares têm bom senso e eu não vou precisar pedir ao prefeito que não sancione isso.”

 

Confira a entrevista na íntegra

 

 

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