Advogado acusa oito policiais do Bope de agredir filho com chutes e golpes de madeira: ‘foi torturado’


Pai da vítima, um advogado de 52 anos, relatou que a família vive com medo após episódio de agressões. Polícia Militar, que responde pelo Bope, disse que ‘abordagem policial, seguida de revista pessoal, é uma ação respaldada em Lei’. Técnico de celulares é agredido por oito policiais com chutes e golpes de madeira
“O que o meu filho passou foi mais do que agressão, foi tortura. Meu filho foi torturado”. A denúncia é de um advogado, de 52 anos, que afirma que o filho, de 27, foi agredido com chutes, socos e golpes com a madeira por oito policiais militares da Força Tática, que integram o Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope), em Boa Vista. Em entrevista ao g1 nessa segunda-feira (9), ao pai afirma que a família cogita sair do estado por conta de ameaças que receberam após o episódio.
A abordagem ao jovem, que trabalha como técnico de celulares, ocorreu quando ele estava na frente de casa, no bairro Santa Luzia, zona Oeste da cidade, no dia 11 novembro. Um amigo dele também foi agredido. Ele mora no imóvel com a esposa grávida, mas ela não estava no local.
Segundo o pai, os PMs queriam que o filho desse informação sobre uma moto supostamente roubada. O advogado teme pela segurança da família e pediu para ele e a vítima não serem identificados na reportagem.
O pai registrou um boletim de ocorrência contra a Polícia Militar pelo crimes de tortura no contexto de emprego de violência para obter informação no 4º Distrito Policial. Além disso, formalizou denúncia no Ministério Público de Roraima (MPRR) pedindo investigação e também na Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados de Roraima (OAB-RR).
Em depoimento à Polícia Civil, o jovem agredido negou qualquer envolvimento ou conhecimento com suposto roubo da moto. Disse ainda que após o espancamento, os PMs perguntaram o nome completo dele, anotaram e tiraram fotos do rosto à força.
Ao pai, a vítima contou que durante a ação os policiais desligaram o disjuntor de energia da casa e começaram a fazer perguntas sobre a suposta moto roubada porque o rastreador apontava para aquele local.
“Como meu filho e o outro rapaz negaram saber de algo, os policiais os levaram para outro cômodo e começaram a bater. Usaram pedaços de pau, deram chutes e socos. As agressões duraram cerca de 50 minutos, com pausas para mais perguntas”, contou o pai ao g1.
Procurada, a Polícia Militar, que responde pelo Bope, “a abordagem policial, seguida de revista pessoal, é uma ação respaldada em Lei, realizada como parte da promoção da segurança pública.” A corporação também disse que “caso a investigação comprove a veracidade das acusações, os policiais militares envolvidos serão responsabilizados nos termos da lei e do regulamento disciplinar”.
Câmeras de segurança registraram o momento em que os policiais chegaram na casa da vítima, por volta de 19h47, descem da viatura, iniciam a abordagem ao jovem e o amigo dele. Em seguida, entram na casa e saem por volta de 20h15 – 28 minutos depois.
“Eles desceram e abordaram quem estava lá. Um vizinho também apareceu para conversar com eles, mas foi liberado. Já o meu filho e o outro rapaz que estavam lá foram levados para dentro da casa para serem torturados”, contou o pai.
A reportagem também procurou a Polícia Civil e questionou se o caso está sendo investigado. Também procurou a OAB-RR e o Ministério Público de Roraima e aguarda resposta.
Imagens feitas após a agressão registraram os ferimentos e hematomas que ficaram no jovem após a ação dos policiais (veja no vídeo acima). No mesmo dia, depois da violência policial, o filho ligou para o pai pedindo ajuda.
‘Momento de terror’
Jovem de 27 anos foi vítima de agressões com chutes, socos e pedaço de madeira em Boa Vista
Reprodução/Arquivo Pessoal
As imagens de uma câmera de segurança na rua da casa do jovem mostram quando duas viaturas da Força Tática do Bope chegam na frente da casa onde vivia o jovem com a esposa.
Ele e o amigo estavam sentados na frente do imóvel. Outras pessoas também estavam próximas ao local, mas só os dois foram levados para dentro da casa.
“Eles espancaram e o pressionaram contra o chão. Ele recebeu vários socos, chutes, coronhadas até pauladas. Além disso, os policiais fizeram fotos e vídeos dele e do amigo, enquanto os questionavam coisas que eles não sabiam. Os dois foram agredidos mas [o meu filho] foi o que levou mais pancada”, conta o pai ao g1.
Depois das agressões, com o jovem ferido, eles revistaram a casa, mas não encontraram nada que justificasse a abordagem. Os vizinhos ouviram os gritos e os pedidos de socorro. O pai conta que alguns até tentaram registrar o que estava acontecendo, mas antes de irem embora, os policiais intimidaram os moradores.
“Saíram e deixaram o meu filho muito ferido. Intimidaram todos mundo, até os vizinhos que ouviram tudo e queria gravar tirar foto, mas não conseguiram pois os agentes não permitiram”.
“Eles usaram pedaços de pau, deram muitos chutes na região abdominal e socos. Meu filho tentou proteger a cabeça com os braços, mas acabou ficando com hematomas. Hoje, as marcas já diminuíram, mas ele ainda sente dores. Dores mentais também”, conta o pai.
Após as agressões, o jovem ligou para o pai, que foi até o local, e encontrou o filho ferido no chão. O jovem foi levado para o Hospital Geral de Roraima (HGR) na mesma noite. O g1 perguntou da Secretaria Estadual de Saúde (Sesau), que responde pela unidade, sobre qual atendimento foi dado à vítima e aguarda resposta.
“Ele ainda sente dores musculares, mas graças a Deus não houve lesões internas graves. Psicologicamente, ele está muito abalado. Não consegue dormir direito e fica muito assustado ao ver viaturas na rua. Vou levá-lo ao psicólogo esta semana”, relata o pai.
Traumas e ameaças
Abordagem da Força Tática da PM de Roraima filmada por câmeras de segurança
Reprodução/Arquivo Pessoal
Após o episódio, ainda segundo o jovem agredido, um dos policiais, em tom de ameaça, perguntou se ele “sabia quem tinha visitado a casa, apontando o símbolo da Força Tática”, e disse que, “se ele ou a família denunciassem, eles voltariam”. Isso deixou a família preocupada.
O amigo que estava com o jovem no dia das agressões passou alguns dias escondido e incomunicável por medo das ameaças recebidas. Agora, o pai pede que seja feita Justiça pelo filho.
“Da semana passada para cá, meu filho já recebeu duas ameaças. Não foram diretamente a ele, mas a pessoas próximas. Não sei se vieram dos mesmos policiais, mas são da PM. Inclusive, no domingo [8], abordaram um amigo dele”.
“O rapaz que estava com ele no dia da abordagem desapareceu por um tempo, mas depois encontrou meu filho e pediu para ele me dar um recado: ‘Fala para o teu pai parar com isso, senão vão acabar te matando”, relatou o advogado.
Hoje, o pai teme pela própria vida e da do filho. A sensação, de acordo com ele, é de medo e de insegurança.
“Eu temo pela minha vida e pela vida do meu filho. Ele tem família, e a esposa está grávida. Não entendo por que esses policiais estão agindo assim. É revoltante”.
“A sensação é de medo, de insegurança. Não se trata de um caso isolado, as autoridades precisam tomar as medidas legais urgentes a fim de apurar e punir os policiais que adotarem condutas contrárias lei e a ordem”, relatou o pai.
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