Famílias cobram solução dois anos após morte de trabalhadores envenenados em fazenda na Bahia: ‘Parece que ficou por isso mesmo’


Caso aconteceu em maio de 2022, mas inquérito só foi concluído em outubro de 2024, confirmando a intoxicação por agrotóxico das três vítimas. Vitor, Igor e Marcone morreram após envenenamento por agrotóxico na Bahia
Arquivo Pessoal
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Familiares dos três trabalhadores que morreram envenenados em 2022, em uma fazenda na zona rural de São Félix do Coribe, cidade no oeste da Bahia, ainda aguardam uma solução para o caso. Depois de mais de dois anos, nenhum julgamento aconteceu e os envolvidos ainda não foram responsabilizados.
O g1 teve acesso com exclusividade ao inquérito da Polícia Civil (PC), nesta sexta-feira (6). Após a investigação, apenas uma mulher foi indiciada e pode responder por homicídio culposo.
Elis Regina Lopes Santos era fiscal dos trabalhadores, que colhiam pimenta na Fazenda Boa Vista, e teria entregado a bebida que os envenenou no dia 20 de maio daquele ano. Todos estavam em um ônibus, aguardando o pagamento da semana, quando ingeriram o líquido de um frasco de plástico, pensando se tratar de cachaça.
No entanto, conforme aponta o laudo pericial que integra o inquérito, o grupo bebeu um forte inseticida, chamado metomil. Na ocasião, além das mortes de Marcone Ferreira de Souza, de 35 anos, Vitor Oliveira de Assis, de 17, e Igor Gabriel Santos Conceição, de 19, outras quatro pessoas foram hospitalizadas por causa da substância.
O documento com essas conclusões só ficou pronto em outubro de 2024, dois anos e cinco meses após o envenenamento. Ele foi enviado no mesmo mês ao Ministério Público da Bahia (MP-BA), que ainda não pontuou se vai ou não oferecer denúncia à Justiça.
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Detalhes de indiciamento
No inquérito, o delegado Luis Felipe Guedes Santos, que conduz a investigação, apontou o inseticida como “altamente tóxico”, e responsabilizou a indiciada por oferecer o conteúdo da garrafa, mesmo que tenha afirmado em depoimento não saber do que se tratava.
“A conduta ao oferecer um produto que não se tratava de uma bebida alcoólica, mas sim de um agrotóxico, se caracteriza como imprudente e negligente, uma vez que deveria ter se certificado da natureza da substância antes de oferecê-la aos trabalhadores”, descreve o delegado.
Ainda segundo a polícia, a análise dos depoimentos e das provas demonstra que, embora não houvesse a intenção de causar dano, a negligência resultou em “consequências trágicas” que caracterizam a responsabilidade pelo delito.
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Famílias cobram justiça
Diante da demora, familiares das vítimas buscam uma solução para as mortes. Entre eles, Lucilia Assis, mãe de Vitor Oliveira, que cobra a celeridade do caso.
“Eu sofro até hoje com a falta do meu filho e com as dúvidas sobre a morte dele. Nós esperamos uma conclusão, queremos saber o que realmente aconteceu. A justiça tem que ser feita e já são mais de 2 anos sem resposta”, afirmou.
O rapaz trabalhava na fazenda há duas semanas e receberia o segundo pagamento pelo serviço prestado no dia em que foi envenenado. Dinheiro que foi enviado para as famílias, mas que não foi aceito em protesto pelas mortes.
Vitor tinha um filho, que completou um ano no mesmo dia do ocorrido. Para a mãe do adolescente, a morte precoce “é uma marca para toda a vida” dela e do neto, que completou 3 anos em 2024.
Na mesma situação, está a família de Marcone, que também trabalhava há pouco tempo na fazenda. Ele deixou dois filhos, que hoje estão com 7 e 8 anos.
“Já vai fazer três anos que meu irmão morreu e a gente não teve resposta nenhuma sobre essa morte. A gente fica sofrendo até hoje, porque mãe nenhuma quer perder o seu filho. E minha mãe sofre com os dois filhinhos dele”, disse à reportagem Eliane Ferreira, irmã da vítima.
À reportagem, a mãe de Igor, Marília Alves, descreveu sentimentos parecidos com os sentidos pelos familiares das outras vítimas de envenenamento: sofrimento e angústia pela falta de justiça e de respostas.
A advogada Linda Correia, representante legal das famílias de Vitor e Igor, aguarda e cobra a chegada do caso à Justiça.
“O inquérito policial foi concluído depois de várias reclamações feitas por mim junto à procuradoria do Ministério Público, que cobrou o Ministério Público. As famílias dos meus clientes continuam sem resposta até o momento. Estamos lutando”, afirmou.
O que dizem as autoridades e os envolvidos
Procurada pela reportagem, a PC reforçou informações contidas no documento que o g1 teve acesso e pontuou que, após a conclusão do inquérito, o caso segue com o MP-BA.
Em nota, o MP-BA confirmou que a situação está sob acompanhamento, mas afirmou que detalhes não seriam compartilhados pois o processo corre em segredo de Justiça. Não há previsão para o decorrer do processo.
O g1 procurou a defesa do responsável pela fazenda, mas não teve retorno até a última atualização deste texto. A reportagem também tentou contato com a defesa da indiciada, mas não conseguiu.
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